No período que antecede à celebração da Páscoa, mais precisamente no ‘domingo de ramos’, geralmente se recorda o episódio da entrada triunfal de Jesus em Jerusalém, quando a multidão estendeu mantos e ramos e proclamava: “Hosana ao Filho de Davi! Bendito é o que vem em nome do Senhor! Hosana nas alturas!” (Mt 21:9).
Com base neste evento, poderíamos usar o ditado popular que diz: “A voz do povo é a voz de Deus” e conforme Lucas 19:39-40, alguns fariseus pediram que Jesus repreendesse a multidão, ao que Jesus respondeu: “Asseguro-vos que, se eles se calarem, as próprias pedras clamarão”. Ou seja, Jesus confirmou a declaração do povo, que neste momento eram ‘a voz do próprio Deus’ falando através do povo.
Contudo, veja este mesmo povo, pouco tempo depois: quando Pilatos buscando ser ‘democrático’ resolve consultar o povo para decidir o que fazer com Jesus, e o povo grita: “Crucifica-o!Crucifica-o! (Lc. 23:21). O povo pediu para Jesus ser crucificado. O texto cita que Pilatos desejava soltar Jesus (v.20), contudo após três tentativas, resolve agradar ao povo e “…decidiu atender-lhes o pedido” (v. 24).
Considero a democracia (e a consulta popular), como o sistema de governo mais viável atualmente, mas como nos tempos de Jesus, o povo nem sempre faz as melhores escolhas. O mesmo povo que escolhe seus governantes é aquele que posteriormente, o critica.
A questão é que buscar agradar o povo não é fácil, e nem sempre é o mais certo a se fazer.
Vejamos outro exemplo da ‘voz do povo’, agora no antigo testamento, em Êxodo 15. O capítulo inicia com um cântico de louvor a Deus, após a travessia do Mar Vermelho. As estrofes deste cântico seguem até o versículo 21. E, no versículo 22, quando surge a primeira dificuldade (falta de água), e “o povo começou a reclamar a Moisés…” (v.24). Num momento louvando o Criador e pouco depois, reclamando do mesmo. O povo é instável, e muda de opinião com facilidade.
Contudo, buscar saber a opinião popular é algo tão natural que o próprio Jesus, quando se dirigia para os povoados nas proximidades de Cesaréia de Filipe, perguntou para seus discípulos: “Quem o povo diz que eu sou?” Eles responderam: “Alguns dizem que és João Batista; outros, Elias, e, ainda outros, um dos profetas” (cf. Mc.8:27-28). Neste momento, por não conhecerem realmente Jesus, não há unanimidade na resposta do povo.
O teólogo britânico Alcuíno (735-804) – a quem erroneamente já se atribuiu a autoria deste ditado – escreveu: “Não devem ser ouvidos os que costumam dizer que a voz do povo é a voz de Deus, pois a impetuosidade do vulgo está sempre próxima da insânia”.
Esta frase, na verdade, tem uma origem pagã: surgiu na cidade de Acata, na Grécia, quando as pessoas consultavam o ‘deus’ Hermes, fazendo uma pergunta no seu ouvido, e depois cobria a cabeça com um manto e saia à rua, então as primeiras palavras que ouvia do ‘povo’ declarava ser a resposta de ‘deus’. Veja que era mais uma tentativa de agradar o povo, do que a resposta de um falso deus.
Trazendo para nosso contexto de vida cristã, quantas vezes ouvimos as vozes da rua (povo)? Ou seja, fazemos aquilo que a maioria considera correto, ou normal, indo contra os ensinamentos de Deus? Antes de seguir a maioria e achar que está tudo bem, busquemos ouvir o que Deus tem a nos falar através de Sua Palavra. E, assim, possamos como o apóstolo Paulo, declarar: “Porventura, procuro eu agora o louvor dos homens ou a aprovação de Deus? Se ainda estivesse querendo agradar a homens não seria servo de Cristo…” (1 Gl.1:10). Espero que, como servos de Cristo, Deus nos abençoe para ouvirmos mais a Sua voz, que a voz do ‘povo’ (multidão). “Quem tem ouvidos para ouvir, ouça” (Mt.13:9).