É bem provável que o leitor algum dia já ouviu falar em usucapião. A usucapião é a aquisição da propriedade de um bem móvel ou imóvel, mediante a posse continuada durante determinado tempo exigido por lei, esse tempo varia conforme é o bem usucapido. Desse modo, toda pessoa que ocupar um imóvel, por exemplo, rural ou urbano, como se dono fosse, durante determinado tempo, poderá requerer que lhe seja concedido o domínio (a propriedade), desde que durante o tempo da posse não tenha havido oposição de quem quer que seja[1].
Não se pode confundir a posse decorrente de contrato de locação (aluguel) com a posse de imóvel por determinado tempo sem que o proprietário reclame (peça) o imóvel. O contrato de locação, mesmo que por longo período, por exemplo, mais de 20 anos, não enseja a usucapião, isto é, a perda da propriedade, mas, por outro lado, o abandono do imóvel por parte de seu proprietário, por longo período (este tempo varia dependendo da modalidade da usucapião) pode ensejar a perda da propriedade.
Esta possibilidade de perda de um bem por abandono por determinado lapso temporal decorre da lei premiar aquele que se utiliza utilmente do bem, como, no caso, reside no imóvel, conserva limpo e planta na propriedade. Na verdade, trata-se de uma penalidade para aquele proprietário que abandona o bem por determinado período, sem impedir que outra pessoa dê destinação devida ao móvel ou imóvel.
Existem algumas modalidades de usucapião na lei. Assim, para se requerer a usucapião, é necessário que se cumpra alguns requisitos, conforme a modalidade. Aqui abordaremos os pressupostos para a concessão da usucapião extraordinária, usucapião ordinária, usucapião rural especial, usucapião urbano especial, usucapião urbano coletivo e usucapião familiar/conjugal.
Usucapião extraordinária
A usucapião extraordinária encontra-se prevista no artigo 1.238 do Código Civil:
Art. 1.238. Aquele que, por quinze anos, sem interrupção, nem oposição, possuir como seu um imóvel, adquire-lhe a propriedade, independentemente de título e boa-fé; podendo requerer ao juiz que assim o declare por sentença, a qual servirá de título para o registro no Cartório de Registro de Imóveis.
Parágrafo único. O prazo estabelecido neste artigo reduzir-se-á a dez anos se o possuidor houver estabelecido no imóvel a sua moradia habitual, ou nele realizado obras ou serviços de caráter produtivo.
Nota-se que a lei não exige do possuidor que este tenha boa-fé, muito pelo contrário, o possuidor pode estar até de má-fé. O que é exigência legal é o comportamento como se fosse proprietário (possuir como seu o imóvel), por 15 anos, sem interrupção, nem oposição. Caso o possuidor houver estabelecido no imóvel a sua moradia habitual, ou nele realizado obras ou serviços de caráter produtivo, o prazo será de 10 anos.
Usucapião ordinária
Por sua vez, a usucapião ordinária está no artigo 1.242 do Código Civil:
Art. 1.242. Adquire também a propriedade do imóvel aquele que, contínua e incontestadamente, com justo título e boa-fé, o possuir por dez anos.
Parágrafo único. Será de cinco anos o prazo previsto neste artigo se o imóvel houver sido adquirido, onerosamente, com base no registro constante do respectivo cartório, cancelada posteriormente, desde que os possuidores nele tiverem estabelecido a sua moradia, ou realizado investimentos de interesse social e econômico.
Neste caso, o prazo da posse é de 10 anos, desde que o possuidor possua justo título, isto é, uma escritura que contenha alguma irregularidade ou outro documento que comprove a aquisição do imóvel, mas que não serve como prova da propriedade. Além disso, é necessário que o adquirente haja com boa-fé, ou seja, deve provar que ignorava os vícios ou defeitos do título durante todo o período.
Usucapião urbano especial
Esta modalidade encontra-se prevista no artigo 1.240 do Código Civil:
Art. 1.240. Aquele que possuir, como sua, área urbana de até duzentos e cinquenta metros quadrados, por cinco anos ininterruptamente e sem oposição, utilizando-a para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural.
§ 1o O título de domínio e a concessão de uso serão conferidos ao homem ou à mulher, ou a ambos, independentemente do estado civil.
§ 2o O direito previsto no parágrafo antecedente não será reconhecido ao mesmo possuidor mais de uma vez.
Dessarte, o possuidor deverá provar que a área urbana é de até 250m2.; ter ocupado pelo prazo de, no mínimo, 05 anos; no prazo de ocupação não ter havido interrupção da ocupação ou oposição do proprietário; utilização para moradia ou de sua família; não ser proprietário de outro imóvel, seja ele urbano ou rural; ter se comportado como proprietário fosse (demonstrar de que possui o terreno como seu).
Usucapião rural especial
Uma outra espécie de usucapião (usucapião rural especial) é a contida no artigo 1.239 do Código Civil:
Art. 1.239. Aquele que, não sendo proprietário de imóvel rural ou urbano, possua como sua, por cinco anos ininterruptos, sem oposição, área de terra em zona rural não superior a cinquenta hectares, tornando-a produtiva por seu trabalho ou de sua família, tendo nela sua moradia, adquirir-lhe-á a propriedade.
Exige a lei que o possuidor de terras rurais não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural, e exerça a posse como se fosse sua, por 05 anos ininterruptos, sem oposição, desde que não seja superior a cinquenta hectares, tornando-a produtiva por seu trabalho ou de sua família, tendo nela sua moradia.
Usucapião familiar/conjugal
O artigo 1.240-A do Código Civil dispõe sobre a modalidade da usucapião familiar:
Art. 1.240-A. Aquele que exercer, por 2 (dois) anos ininterruptamente e sem oposição, posse direta, com exclusividade, sobre imóvel urbano de até 250m² (duzentos e cinquenta metros quadrados) cuja propriedade divida com ex-cônjuge ou ex-companheiro que abandonou o lar, utilizando-o para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio integral, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural.
§ 1 o O direito previsto no caput não será reconhecido ao mesmo possuidor mais de uma vez.
É a modalidade de usucapião cujo direito, assegurado a um dos cônjuges, decorre do abandono do lar pelo outro. Porém, para que seja concedido este direito, é necessário que o cônjuge possuidor do imóvel, cuja propriedade dividia com ex-cônjuge ou ex-companheiro que abandonou o lar, faça uso para sua moradia ou de sua família, mediante a posse por 02 anos ininterruptos, sem oposição, sobre imóvel urbano de até 250m2.
Há outras modalidades de usucapião na legislação, mas nos restringimos a indicar as principais modalidades.
A usucapião poderá ser realizada na via judicial ou administrativa (cartório), sendo que, em ambas as hipóteses, é necessário que seja acompanhado por um advogado. Portanto, para dar início a qualquer pedido relativo à usucapião, é necessário que seja consultado um advogado.