Por Pastor Willian Dornellas
Penso que nenhum de nós tem dificuldade em afirmar a doutrina da Soberania de Deus. Está categoricamente claro nas Escrituras que nosso Deus governa sua criação com poder, justiça e sabedoria. Nada escapa ao seu controle. Todavia, há uma discussão acerca desse tema motivado pelas tragédias, como: o acidente com o avião da TAM, no aeroporto de Congonhas (18/07/07), em que morreram 199 pessoas; ou o devastador Tsunâmi (26/12/04), que vitimou pelo menos 220 mil pessoas na Ásia; e um dos últimos terremotos no Haiti, que também levou mais de 200 mil e destruiu uma cidade inteira. Daí o debate que tem sido travado entre duas correntes teológicas:
1- A Teologia Relacional, também conhecida como Teologia Aberta, Teologia do Processo ou Teologia da Autolimitação Divina. Ela ensina que Deus, no início da criação, teria aberto mão de sua Soberania e Onisciência a fim de, em sociedade com o homem, construir a história e estabelecer relacionamentos verdadeiros. Dessa forma, veem as tragédias como acontecimentos que fogem ao controle de Deus. Ele não pode evitá-las. Segundo os proponentes desse pensamento, Deus sofre diante das catástrofes com o mesmo sentimento de impotência que se nos impõe quando somos atingidos por elas.
2- A Teologia Reformada sustenta a Soberania de Deus, mesmo em meio às mais absurdas tragédias. A Confissão de Fé de Westminster afirma: “pela sua sábia providência, segundo a sua infalível presciência e o livre e imutável conselho da sua própria vontade, Deus, o grande Criador de todas as coisas, para o louvor da glória da sua sabedoria, poder, justiça, bondade e misericórdia, sustenta, dirige, dispõe e governa todas as suas criaturas, todas as ações e todas as cousas, desde a maior até a menor”. De acordo com esta confissão, não há como imaginar alguma coisa da qual se possa dizer que tenha acontecido sem antes ter passado pelo crivo de Deus.
Ora, quantos de nós não temos vivenciado histórias dramáticas em nossa vida? Quantas situações sinistras poderiam ser compartilhadas. Experiências sentidas por homens e mulheres de Deus que, não obstante a sua dedicação e amor à causa do Senhor, são vítimas de injustiças, de calúnias, de perseguições, de traições, de privações, de enfermidades e outros sofrimentos. Como, pois, sustentar a doutrina da Soberania de Deus à vista dessas coisas?
Mateus 26: 26-75 concilia as duas noções. É a narrativa dos instantes que antecederam a cruz. Aqui, fica absolutamente claro que a vontade do Pai está sendo executada. Os versículos 31, 54 e 56 salientam que todas as coisas estavam acontecendo para que se cumprissem as Escrituras. O que significa que fazer a vontade de Deus não é uma garantia de isenção de sofrimentos e que sofrimentos nem sempre são indicativos de que alguém não esteja fazendo a vontade Dele. Porque aqui Jesus se submete totalmente à vontade do Pai e, no entanto, prova as mais amargas experiências:
– Experimenta a dor da traição, ao ver aquele em quem investiu seu tempo, seu afeto e cultura e com quem compartilhou sua vida, trair sua amizade e lhe apunhalar pelas costas.
– Experimenta o pavor da morte que se aproximava cada vez mais.
– Experimenta o abandono dos amigos que não lhe foram solidários quando deles precisou.
– Experimenta a frustração ao ver Pedro, seu discípulo, agir como um mundano e lançar mão da espada, contrariando todos os ensinamentos que dele recebera ao longo dos últimos três anos.
– Experimenta a frustração ao ver a negação de um dos melhores amigos que, diante de uma situação pública, afirma jamais tê-lo conhecido, não ter com ele a menor relação, não guardar a lembrança de nenhum encontro.
– Enfim, experimenta as mais horríveis humilhações, zombarias e as mais lancinantes dores físicas até ser crucificado no madeiro.
Se Jesus sabia que passaria por tudo isso, por que se submeteu à vontade do Pai? Jesus se submeteu à vontade do Pai porque descansava Nele. Quando Pedro golpeou o servo do sumo sacerdote, cortando-lhe a orelha, Jesus lhe disse: “Guarde a espada! Pois todos os que empunham a espada, pela espada morrerão. Você acha que eu não posso pedir ao meu Pai, e ele não colocaria imediatamente à minha disposição mais de doze legiões de anjos? Como então se cumpririam as Escrituras que dizem que as coisas deveriam acontecer desta forma?”, vv. 52-54 – NVI.
Isto é descansar na SOBERANIA de Deus: é desistir de lutar com as próprias armas! É aceitar a liberdade de Deus de usar os instrumentos que pensamos que não usaria e de não usar os instrumentos que pensamos que usaria. Enfim, é saber que todas as coisas, em última instância, cooperam para nosso bem, mesmo aquelas que se nos apresentam com cara de absurdo. Cristo descansava na Soberania de Deus e isso implicou na maneira como reagiu diante dos sofrimentos que enfrentou.
Texto base: Mt 26: 26-75 (54)