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Direitos dos motoristas de caminhão

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Direitos dos motoristas de caminhão

Nos últimos anos, sob o argumento de mudança nas formas de trabalho, houve profundas alterações na legislação trabalhista. O Direito do Trabalho, por disciplinar inúmeras relações de trabalho, que envolvem várias categorias profissionais, como pedreiro, motorista, advogado, enfermeiro, motorista e outros, possui muitas leis esparsas, que versam sobre as mais diversas profissões. É neste contexto que adveio a Lei n. 12.619/2012, que disciplina o exercício da profissão de motorista, regulamentada, posteriormente, pela Lei n. 13.103/2015.

Como a Lei n. 13.103/2015 trata de motorista profissional, em sentido genérico, abarcando motorista que transporta carga, bem como motorista que transporta passageiro, além de outras situações, iremos tratar nesta coluna apenas direitos do motorista de caminhão, o conhecido caminhoneiro.

 

1. jornada de trabalho.

A jornada de trabalho do caminhoneiro encontra seu limite na Constituição Federal, que prevê 8 horas diárias e 44 horas semanais. Existe a possibilidade de prorrogação (horas extras) por até 2 horas por dia de trabalho. Caso o motorista seja obrigado a realizar jornadas de trabalho exaustivas, como dirigir por mais de 12 horas por dia, o que aumenta o risco de acidentes em razão da exaustão, há precedentes do Tribunal Superior do Trabalho (TST) que entende que isso gera dano existencial (espécie de dano moral):

[…]  O dano existencial é espécie do gênero dano imaterial cujo enfoque está em perquirir as lesões existenciais, ou seja, aquelas voltadas ao projeto de vida (autorrealização – metas pessoais, desejos, objetivos, etc) e de relações interpessoais do indivíduo. Na seara juslaboral, o dano existencial, também conhecido como dano à existência do trabalhador, visa examinar se a conduta patronal se faz excessiva ou ilícita a ponto de imputar ao trabalhador prejuízos de monta no que toca o descanso e convívio social e familiar. Nesta esteira, esta Corte tem entendido que a imposição ao empregado de jornada excessiva ocasiona dano existencial, pois compromete o convívio familiar e social, violando, entre outros, o direito social ao lazer, previsto constitucionalmente (art. 6º, caput). Na hipótese dos autos, depreende-se da v. decisão regional, que o reclamante exercia a função de motorista de carreta e fazia uma jornada de trabalho de segunda a sábado, das 7h às 22h, totalizando em 15 (quinze) horas diárias de trabalho. Assim, comprovada a jornada exaustiva, decorrente da conduta ilícita praticada pela reclamada, que não observou as regras de limitação da jornada de trabalho, resta patente a existência de dano imaterial in re ipsa, presumível em razão do fato danoso. […] No caso, em exame, levando em consideração a gravidade e extensão do dano (jornada exaustiva do autor de 15 horas diárias), a capacidade econômica das partes, o grau de culpa da reclamada, além do caráter pedagógico entendo razoável reduzir o valor da indenização por danos morais, pela jornada exaustiva, para o importe de R$ 20.000,00 (vinte mil reais), valor que vem sendo fixado por esta Turma no julgamento de casos análogos. (TST, Recurso de Revista n. 001351-49.2012.5.15.0097).

Além do dano existencial (espécie de dano moral), o Tribunal Superior do Trabalho (TST) tem precedentes que reconhece que a realização de horas extras acima do limite legal (além das 2 horas por dia prevista na Constituição Federal) e, ainda, a falta de pagamento destas, além de gerar dano moral, implica na rescisão indireta do contrato de trabalho, isto é, a ruptura do contrato de trabalho por culpa exclusiva do empregador. Em outras palavras, é como se o empregado estivesse dando a conta para o patrão, com justa causa, pelo descumprimento da lei por parte do patrão. Neste caso, o empregado recebe todos os seus direitos rescisórios, tais como aviso prévio, décimo terceiro salário proporcional, férias vencidas e proporcional, um terço de férias, FGTS, multa de 40% sobre o saldo do FGTS, seguro desemprego, etc. Vejamos o seguinte julgado do TST:

 

[…] RESCISÃO INDIRETA. DESCUMPRIMENTO DE OBRIGAÇÕES ESSENCIAIS DO CONTRATO DE TRABALHO. SUBMISSÃO DO EMPREGADO À EXTENSA JORNADA DE TRABALHO SEM A RESPECTIVA CONTRAPARTIDA REMUNERATÓRIA. NÃO RECEBIMENTO INTEGRAL DE DIÁRIAS DE VIAGEM NEM DE LANCHE. NÃO CUMPRIMENTO DE OBRIGAÇÃO CONVENCIONAL RELATIVAMENTE À CONTRATAÇÃO DE PLANO DE SAÚDE E SEGURO DE VIDA. Em conformidade com a jurisprudência desta Corte, o descumprimento de obrigações essenciais do contrato de trabalho, tais como, a exigência de prestação de serviços em sobrejornada, sem a respectiva contrapartida remuneratória, consubstancia justificativa suficientemente grave para configurar a justa causa, por culpa do empregador, a ensejar a rescisão indireta do pacto laboral, nos termos do artigo 483, “d”, da CLT. […] (TST, RR-10365-40.2013.5.03.0167).

 

2. Controle de jornada e horas extras.

A obrigatoriedade de controle de jornada passou a ser expressamente exigida, obrigando as transportadoras a implementar controle mediante anotação em diário de bordo, papeleta ou ficha de trabalho externo, ou sistema e meios eletrônicos instalados nos veículos. Assim, caso o motorista alegue na Justiça que realizou horas extras, cabe ao empregador provar o contrário. Caso o empregador (patrão) não demonstre com documentos que o funcionário não realizou horas extras, será condenado a pagar as horas extras cobradas pelo empregado.

 

3. Tempo de espera.

É comum, entre um frete e outro, o motorista ter que esperar. Este período de espera é considerado como “tempo de espera”. As horas relativas ao tempo de espera serão indenizadas na proporção de 30% (trinta por cento) do salário-hora normal.

O prazo máximo para carga e descarga será de 5 horas, contadas da chegada do veículo ao endereço de destino, após o qual será devido a importância equivalente a R$ 1,73 (um real e setenta e três centavos) por tonelada/hora ou fração. Este valor é atualizado anualmente, de acordo com a variação do Índice Nacional de Preços ao Consumidor – INPC, calculado pela Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE, e já sofreu atualização no ano de 2020. O tempo de espera é calculado a partir da hora de chegada na procedência ou no destino, sendo que, caso ultrapassado o período de 5 horas, contadas da chegada do veículo ao endereço de destino, o valor será devido desde a chegada. O embarcador e o destinatário da carga são obrigados a fornecer ao transportador documento hábil a comprovar o horário de chegada do caminhão nas dependências dos respectivos estabelecimentos, sob pena de serem punidos com multa a ser aplicada pela Agência Nacional de Transportes Terrestres – ANTT, que não excederá a 5% (cinco por cento) do valor da carga.

 

4. Trabalho no horário noturno.

Considera-se noturno o trabalho executado entre as 22 horas de um dia e as 5 horas do dia seguinte. Em regra, a hora de trabalho corresponde a 60 minutos. No entanto, a hora do trabalho noturno será computada como de 52 minutos e 30 segundos, isto é, a cada hora de 60 minutos trabalhada pelo motorista no período noturno, sobram 7 minutos e 30 segundos, que, caso trabalhado, poderá ser computado como horas extras. Além disso, o trabalho noturno terá um acréscimo de 20 %, pelo menos, sobre a hora diurna. Nos horários mistos, assim entendidos os que abrangem períodos diurnos e noturnos, aplica-se às horas de trabalho noturno.

 

5. Intervalo interjornada.

A cada 24 horas (1 dia), são asseguradas 11 horas de descanso, é o que se denomina intervalo interjornada, sendo facultados o seu fracionamento e a coincidência com os períodos de parada obrigatória na condução do veículo estabelecida pelo Código de Trânsito Brasileiro, garantidos o mínimo de 8 (oito) horas ininterruptas no primeiro período e o gozo do remanescente dentro das 16 (dezesseis) horas seguintes ao fim do primeiro período.

Nas viagens de longa distância, assim consideradas aquelas em que o motorista profissional empregado permanece fora da base da empresa, matriz ou filial e de sua residência por mais de 24 horas, o repouso diário de 11 horas (intervalo interjornada) pode ser feito no veículo ou em alojamento do empregador, do contratante do transporte, do embarcador ou do destinatário ou em outro local que ofereça condições adequadas.

Nas viagens de longa distância com duração superior a 7 dias, o motorista tem direito ao repouso semanal que será de 24 horas por semana ou fração trabalhada, sem prejuízo do intervalo de repouso diário de 11 horas, totalizando 35 horas, usufruído no retorno do motorista à base (matriz ou filial) ou ao seu domicílio, salvo se a empresa oferecer condições adequadas para o efetivo gozo do referido repouso.

 

6. Adicional de periculosidade.

O Tribunal Superior do Trabalho entende que é devido o adicional de periculosidade, na proporção de 30% sobre o salário do motorista, em razão do simples fato de o veículo possuir um segundo tanque, extra ou reserva, com capacidade superior a 200 litros, mesmo para consumo próprio. Assim, mostra-se indiferente se o combustível é armazenado em tanques originais de fábrica, suplementares ou alterados para ampliar a capacidade do tanque original, pois o que submete o motorista à situação de risco é a capacidade volumétrica total dos tanques, acima de 200 litros, nos termos do art. 193, I, da CLT e do item 16.6 da NR 16:

 

ADICIONAL DE PERICULOSIDADE. TANQUES ORIGINAIS DE FÁBRICA EXISTENTES NO PRÓPRIO VEÍCULO COM CAPACIDADE DE 360 LITROS CADA UM. TRANSPORTE DE COMBUSTÍVEL.

Conforme o entendimento desta Corte, o adicional de periculosidade é devido em razão do simples fato de o veículo possuir um segundo tanque, extra ou reserva, com capacidade superior a 200 litros, mesmo para consumo próprio. Assim, mostra-se indiferente se o combustível é armazenado em tanques originais de fábrica, suplementares ou alterados para ampliar a capacidade do tanque original, pois o que submete o motorista à situação de risco é a capacidade volumétrica total dos tanques, acima de 200 litros, nos termos do artigo 193, I, da CLT e do item 16.6 da NR 16. Precedentes da SbDI-1 e de Turmas deste Tribunal. Recurso de Revista conhecido e provido. (TST-RR-10462-52.2017.5.18.0015, José Roberto Freire Pimenta, DEJT 17.05.19).

 

7. Exames toxicológicos.

Uma das principais obrigações dos motoristas que possuem habilitação na categoria C, D e E é a realização de exames toxicológicos. O procedimento serve para garantir a segurança e o bem-estar do próprio motorista e também das outras pessoas nas rodovias.

Os exames toxicológicos buscam aferir o consumo de substâncias psicoativas que, comprovadamente, comprometam a capacidade de direção e deverá ter janela de detecção mínima de 90 (noventa) dias.

É garantido o direito de contraprova e de recurso administrativo no caso de resultado positivo para os exames toxicológicos.

A reprovação no exame terá como consequência a suspensão do direito de dirigir pelo período de 3 (três) meses, condicionado o levantamento da suspensão ao resultado negativo em novo exame.

 

8. FGTS.

O Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) é descontado na proporção de 8% do salário e é depositado em uma conta vinculada ao contrato de trabalho do empregado.

Para conferir se o empregador está realizando o depósito na conta do FGTS do funcionário, é necessário que o empregado retire um extrato mensal junto à Caixa Econômica Federal para conferência.

Caso constate que o empregador está realizando o desconto do FGTS, mas não está realizando o respectivo depósito, o funcionário tem até 5 anos para ingressar na Justiça e solicitar o depósito. Caso não ingresse na Justiça neste período, o seu direito prescreverá.

É importante frisar que não é necessário que o funcionário seja demitido ou peça demissão para ingressar na Justiça, pois todos os direitos trabalhistas poderão ser cobrados na Justiça mesmo que o empregado esteja prestando serviços para o empregador. Assim, não é necessário que o empregado espere o rompimento do contrato de trabalho para postular os seus direitos na Justiça, até porque, caso já trabalha para o mesmo empregador por mais de 5 anos, mês a mês o seu direito será perdido pela prescrição.

Portanto, é necessário que se fique atento ao prazo prescricional de 5 anos, para não perder os valores que não foram depositados do FGTS.

 

9. Outros direitos.

Por fim, os demais direitos como décimo terceiro salário, férias de 30 dias, 1/3 de férias, permanecem nos moldes dos demais trabalhadores. Pagos integralmente, caso haja trabalhado por 1 ano, ou proporcionalmente, caso não atinja o período de 1 ano.

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Dr. Alcemir da Silva Moraes

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